O termo “aventura” já foi usado para descrever muitos tipos diferentes de jogos — tanto que hoje, ele quase perdeu seu significado. Nos tempos atuais, jogos de aventura muitas vezes significam ação frenética, quebra-cabeças elaborados, ou sistemas de jogabilidade complexos. Mas Amerzone: The Explorer’s Legacy, remake do clássico da desenvolvedora francesa Microids, segue na direção oposta.
Sem combates intensos, com desafios simples e foco total na observação e na narrativa, o jogo surpreende ao entregar uma das experiências mais envolventes e cativantes do gênero. Em vez de impressionar com gráficos ultrarrealistas ou mecânicas rebuscadas, ele conquista pelo charme e pela atmosfera — e pela forma como nos faz mergulhar, sem pressa, em um mundo misterioso.
Uma Viagem ao Passado — Literalmente
A história se passa no fim dos anos 1990. Você controla um jornalista sem nome, enviado por uma revista de Paris para entrevistar o Professor Alexandre Valembois, um explorador recluso vivendo em um farol na costa da Bretanha. À beira da morte, Valembois revela uma obsessão antiga: a terra fictícia de Amerzone, um país sul-americano isolado onde, décadas atrás, ele roubou um ovo gigantesco de uma espécie mítica de aves brancas.
Agora, arrependido, ele pede que você devolva esse ovo a Amerzone — iniciando uma jornada que refaz sua expedição original e revela um país marcado por devastação e tirania, causado por um antigo colega de viagem, o ditador Alvarez.
Clássico Repaginado
O Amerzone original, lançado para PC, usava cenários pré-renderizados e vídeos em FMV — um estilo que lembrava o famoso Myst (1993). Já o remake abandona essa abordagem e aposta em uma exploração em primeira pessoa totalmente em 3D. Você move o personagem livremente, interage com objetos e ativa mecanismos com animações detalhadas — que, apesar de poderem ser puladas, ajudam a reforçar o ritmo contemplativo da jornada.
Essa mudança deixa o jogo mais imersivo. Cada decolagem no veículo Hydrafloat, por exemplo, é vivida em primeira pessoa, com o jogador no controle. Isso dá peso à exploração, e faz com que até os momentos mais simples se tornem memoráveis. Com cerca de dez horas de duração, é o tipo de jogo que fica na cabeça mesmo quando você não está jogando.
Apesar do charme, o jogo tem problemas técnicos — especialmente no PS5. A taxa de quadros sofre quedas frequentes, mesmo em momentos simples, como girar a câmera. E para quem está acostumado com o controle fluido de outros jogos de aventura em primeira pessoa, como Outer Wilds ou Paradise Killer, pode parecer antiquado ainda precisar clicar para andar, como nos point-and-clicks do passado.
Uma das novidades mais interessantes do remake é o sistema de “investigações”. Em cada fase, você coleta pistas para montar artigos sobre a história de Amerzone. Esses arquivos são opcionais, mas ajudam a aprofundar a trama e incentivam uma exploração cuidadosa. E mesmo que você perca alguma coisa, pode revisitar os capítulos depois para completar o que ficou faltando.
Esses elementos não mudam a essência do jogo, mas fazem diferença. Eles me incentivaram a vasculhar cada canto, a ouvir transmissões de rádio com atenção e a ler todas as cartas que encontrava. O ritmo lento, nesse caso, se torna um aliado, e não um obstáculo.
Trilha Sonora de Peso
A ambientação também é reforçada pela trilha sonora original, composta por Inon Zur (conhecido por Dragon Age, Fallout e Starfield) e seu filho Ori Zur. Com apenas doze faixas e vinte minutos de duração, a trilha é breve, mas eficiente: transmite o espírito de uma expedição por ruínas cobertas de selva, com arranjos que misturam cordas densas, sopros exóticos e percussões marcantes.
Uma Aventura Fora do Tempo
No fim das contas, Amerzone: The Explorer’s Legacy é mais do que um simples remake — é uma homenagem a uma forma de contar histórias que parece quase esquecida. Um jogo que não tem pressa, que não quer te impressionar com efeitos ou combates, mas sim com sensações, curiosidade e descoberta.
Para quem aprecia experiências introspectivas, bem escritas e com forte identidade visual, é uma verdadeira joia escondida.